sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

DESIGREJADOS: POR QUE? (PARTE FINAL)



         Nossa última postagem dentro desta série que trata sobre o fenômeno do desigrejamento que vem afetando a sociedade brasileira, aborda a crise identitária e espiritual que atinge a Igreja de forma geral.



A QUESTÃO DA IDENTIDADE



Como verificamos nas postagens anteriores, as perspectivas de rejeição às metanarrativas, aos sistemas absolutos de valores e o desconstrucionismo que nos conduziram a um tempo regido pela hermenêutica, possibilitando que os leitores se apropriem dos textos como se fossem sua propriedade e construam suas próprias interpretações e conceitos. Desta feita, instaura-se o relativismo ético e a “liquidez” conceitual, que fomentam uma falsa sensação de liberdade, na qual a excessiva pluralidade e fragmentação das ideias conduz ao conflito, bem como, à falta de referências mais consistentes.

Essa é a matriz da crise existencial que alcança um contingente cada vez maior de pessoas, em especial, quando se deparam com questões que se mostram duais, como, vida e morte, justiça e injustiça, bem e mal, fé e ciência, bem como, outras temáticas que se mostram de igual modo candentes na reflexão de caráter filosófico e espiritual, a exemplo de Deus, fé, sofrimento, amor, sexualidade, etc.
O que percebemos é a relação direta que tais assuntos mantém naturalmente com o universo teológico-eclesiástico, considerando que são aspectos relevantes na reflexão acerca da espiritualidade humana e na busca metafísica por respostas a questionamentos que se referem a nossa origem, ao que somos, ao sentido ou finalidade de nossa existência, a nossa relação com os outros, com o universo a nossa volta e para onde estamos indo. Não há como desvincular tais coisas da subjetividade e, consequentemente, do pensamento humano.

Entretanto, acreditamos que é lógico o entendimento que a crise que aflige o indivíduo, reflete nas instituições estruturantes de sua identidade e, estas, por sua vez, refletem sua crise identitária nos indivíduos que alcançam, dentro de um acelerado processo de mudanças. Porém, é necessário que tratemos inicialmente do constructo  identidade para aclarar nossas ponderações. E, seguindo esta ótica, um conceito para identidade, a grosso modo, seria o de conjunto de caracteres próprios e exclusivos de um ente animado ou não, através dos quais podemos diferenciá-lo ou incluí-lo dentre os demais de sua mesma natureza e espécie, ou de outros diversos daquele considerado.
De acordo com Bauman (2005), as comunidades são as entidades que definem as identidades e mostram-se de dois tipos: as comunidades de vida e de destino, onde os membros vivem juntos em absoluta ligação, e as comunidades de ideias, nas quais os membros mantêm-se unidos por uma variedade de princípios. Bauman propõe que:

A questão da identidade só surge com a exposição a “comunidades” da segunda categoria – e apenas porque existe mais de uma ideia para evocar e manter unida a “comunidade fundida por ideias” a que se é exposto em nosso mundo de diversidades e policultural. É porque existem tantas dessas ideias e princípios em torno dos quais se desenvolvem essas “comunidades de indivíduos que acreditam” que é preciso comparar, fazer escolhas, fazê-las repetidamente, reconsiderar escolhas já feitas em outras ocasiões, tentar conciliar demandas contraditórias e frequentemente incompatíveis. (BAUMAN, 2005, p. 17)

            A partir dessas considerações de Bauman, inferimos que é inviável o estabelecimento de uma identidade cristã plena, sem a inserção em uma “comunidade” na qual possamos interagir com essa diversidade. E este processo de interação, promove um estado que, segundo os comentários de Faria e Souza (2013) acerca das proposições teóricas de Claude Dubar:


(...) constitui um movimento de tensão permanente entre os atos de atribuição (que correspondem ao que os outros dizem ao sujeito que ele é e que o autor denomina de identidades virtuais) e os atos de pertença (em que o sujeito se identifica com as atribuições recebidas e adere às identificações atribuídas). Enquanto a atribuição corresponde à identidade para o outro, a pertença indica a identidade para si, e o movimento de tensão se caracteriza, justamente, pela oposição entre o que esperam que o sujeito assuma e seja e o desejo do próprio sujeito em ser e assumir determinadas identidades. Logo, o que está no cerne do processo de constituição identitária, segundo o autor, é a identificação ou não identificação com as atribuições que são sempre do outro, visto que esse processo só é possível no âmbito da socialização. (FARIA e SOUZA, 2013, s.p.)
  

            Para Dubar (1997), a síntese da constituição da identidade reside na ocorrência de dois processos: um de caráter relacional, o qual trata da identidade para o outro, com transações de caráter mais objetivo e genérico e, outro de cunho biográfico, que volta-se à identidade para si, cujas transações mostram-se mais subjetivas, compreendendo as identidades herdadas e identidades visadas. Faria e Souza comentam que “a identidade social é marcada pela dualidade entre esses dois processos” (op. cit., s.p.).

            Retomando, portanto, a questão identidade e chamando a atenção para a ideia da crescente velocidade que caracteriza a “liquidez” das formas contemporâneas, retomamos o pensamento de Bauman, ao considerar que:



(...) o “pertencimento” e a “identidade” não têm a solidez de uma rocha, não são garantidos para toda a vida, são bastante negociáveis e revogáveis, e de que as decisões que o próprio indivíduo toma, os caminhos que percorre, a maneira como age – e a determinação de se manter firme a tudo isso – são fatores cruciais tanto para o “pertencimento” quanto para a “identidade”. Em outras palavras, a ideia de “ter uma identidade” não vai ocorrer às pessoas enquanto o “pertencimento” continuar sendo o seu destino, uma condição sem alternativa. Só começarão a ter essa ideia na forma de uma tarefa a ser realizada, e realizada vezes e vezes sem conta, e não de uma só tacada. (BAUMAN, 2005, p. 17-18)



            Essa afirmação nos conduz a compreender que “ser” é mais do que “pertencer”. E essa é possivelmente a chave para a discussão sobre a crise de identidade da Igreja.



DOIS FATOS RELEVANTES


“Ser é mais do que pertencer”. Mas não seria essa a base na qual repousam diversas considerações dos desigrejados, onde mais do que pertencer a uma comunidade, o que importa é ser um bom cristão? Afinal, segundo o que muitos alegam, Jesus Cristo não deixou qualquer forma de igreja organizada e institucional, da qual deveríamos nos tornar membros. E além disso, os sistemas eclesiásticos instituídos sempre buscam perpetuar suas respectivas estruturas e a hierarquias, não permitindo que haja uma atualização ou contextualização de suas formas, priorizando a organização, os métodos e a liturgia em lugar de observar a direção do Espírito Santo e as necessidades reais das pessoas. Assim, a igreja institucional tem cometido graves erros ao longo de sua história. Ainda que esses elementos sejam incômodas verdades, existem dois fatos, essenciais, interdependentes entre si, que precisam ser levados em conta.

O primeiro deles, reside no conceito bíblico da igreja como “corpo de Cristo” (Rm 12.5; 1 Co 12.27) e no serviço que cada cristão desenvolve para o Senhor. Devemos levar em conta que um membro ou órgão só tem utilidade ou só funciona adequadamente no contexto do corpo, atendendo a finalidade para a qual foi criado. E mesmo aqueles membros que parecem ser dispensáveis, têm sua importância. Vejamos o exemplo da vesícula biliar.
A função da vesícula é acumular a bile produzida pelo fígado durante o dia. A bile é um fluido que atua na digestão das gorduras ingeridas pela pessoa. Através de estímulos produzidos pela alimentação, a vesícula se contrai e lança a bile no intestino delgado. Quando a pessoa é submetida a uma colecistectomia (retirada cirúrgica da vesícula biliar), perde essa capacidade de armazenar a bile, que passa a ser liberada pelo fígado diretamente no intestino delgado. Isso provoca uma maior intolerância à ingestão de alimentos gordurosos, o que obriga o cirurgiado a uma mudança de dieta, sob pena de sofrer, por exemplo, de diarreia crônica, pelo excesso de gordura consumida, não absorvida pelo organismo e que será eliminada pelas fezes.
            Para funcionar adequadamente e ser útil, um órgão ou membro, precisa estar inserido no corpo, como um coração que pode continuar batendo após a morte de outras partes do corpo. Para que continue a funcionar e a ser útil, deve ser inserido em outro corpo por meio de um transplante. Todavia, vale ressaltar, que o importante não é só o “pertencimento” a uma comunidade cristã, mas o fato dessa inclusão nos oferecer a oportunidade de gozar duas condições essenciais: a primeira, individualmente, crescimento (que envolve proteção e desenvolvimento espiritual) e, a segunda, coletivamente (porque desenvolve-se para o outro), o exercício orientado de uma atividade estabelecida pelo Senhor – que chamamos de ministério.

Logo, pertencer meramente ao rol de membros de uma igreja, declamar seus princípios orientadores e conhecer seu estatuto e diretrizes, não nos outorga uma identidade cristã. Essa identidade passa a ser construída a partir do fruto que produzimos ou, conforme o pensamento de Bauman, a partir da “tarefa a ser realizada”. Foi isso que Jesus Cristo disse aos seus discípulos no Sermão do Monte, ao afirmar:



Assim, toda a árvore boa produz bons frutos, e toda a árvore má produz frutos maus. Não pode a árvore boa dar maus frutos; nem a árvore má dar frutos bons. Toda a árvore que não dá bom fruto corta-se e lança-se no fogo. Portanto, pelos seus frutos os conhecereis. (Mt 7.17-20)





Essas reflexões nos permitem observar que parte da crise identitária que se alastra no âmbito eclesiástico tem um caráter individual, considerando que muitas pessoas estão perdidas dentro da própria casa, ou seja, não sabem o que, como e quando fazer, para onde ir e com quem podem contar, numa espécie de “cada um por si e Deus por todos”. Falta-lhes, orientação quanto ao exercício de seus dons e talentos de forma produtiva para o Reino e que produza verdadeira satisfação espiritual para si e para a Igreja. Não sabem (ou não querem saber) que papel deveriam estar exercendo na obra, afim de serem “menos inúteis” (Lc 17.10). E isto ocorre por três motivos principais: desinteresse pessoal, negligência dos líderes ou conveniência de pessoas e/ou grupos no ambiente eclesiástico.

Quando não sabemos nosso lugar, nossa função e como realizá-la, perdemos importantes referências para nossa jornada espiritual. Ficamos à mercê daquilo que os outros nos dizem que somos, que devemos ser ou o que é pior, começamos a construir nosso próprio Evangelho e nossa visão individualizada de cristianismo.

Se parte da crise de identidade que alcança o meio eclesiástico reside na individualidade das pessoas, por outro lado, existe um componente desta mesma crise que repousa sobre o aspecto coletivo da igreja. E, desta feita, somos levados ao segundo fato que julgamos relevante considerar: a ideia de missão. 

Ao falarmos de missão, não estamos nos limitando a “romântica” visão que alguns detém quanto à pregação do Evangelho que, não raro, descamba para a prática de um evangelismo de fim de semana incipiente e inócuo ou para o pseudo-heroísmo de alguns que, sem conhecimento e preparo real sobre o trabalho missionário, lançam-se de qualquer jeito ao campo. Fazemos alusão ao exercício cotidiano, integral e multifacetado da determinação dada por Jesus de ir, pregar e discipular gente de todas as nações, o que acarreta uma série de implicações.

Em primeiro lugar, implica em uma igreja atuante, isto é, que não se fecha em si mesma, dentro de seus templos, eventos e estrutura, pesada, desconectada e, sobretudo, falta de altruísmo.

A Igreja precisa sair do marasmo espiritual, que enrijece seus membros e a impede de avançar sobre os territórios dominados pelo inimigo, tingidos pelo pecado.
Precisa abrir mão dos preconceitos escondidos sob os tapetes e atrás das portas dos gabinetes, abrindo portas e janelas, para ouvir a voz dos perdidos, o grito de socorro do mundo com suas mazelas e oferecer a transformação e a paz que só o Senhor Jesus pode operar.

Precisa assumir de forma consciente seu papel de embaixada do Reino na terra, a missão que lhe foi conferida, qualificando e enviando aqueles que Deus chamou e capacitou.

Em segundo lugar, implica em uma Igreja contextualizada, ou seja, que está atenta à realidade contemporânea, aos desafios de toda ordem a sua volta e pronta para discutir alternativas para esses desafios.

Em nome de uma falsa ortodoxia, de uma paralisante tradição, criamos “fantasias”, verdadeiros contos da carochinha na espiritualidade, onde apresentamos um mundo mau, dominado por demônios e seres infernais que se contrapõem às “forças celestiais”, representadas pela Igreja, numa permanente luta pelo domínio das almas humanas.
Não desprezando a noção de batalha espiritual, que é bíblica e real (v. a Carta aos Efésios, capítulo 6, vv. 10 a 18), é preciso parar com essa mentalidade “hollywoodiana” que, na verdade, só tem um propósito: impedir qualquer aproximação dos crentes com qualquer elemento cultural exterior à Igreja.

Graças ao despreparo de muita gente que está na Igreja, principalmente, líderes, não se consegue fazer a distinção entre os elementos culturais e estéticos específicos da sociedade onde estamos inseridos e da qual somos naturais, e o sistema filosófico-espiritual mundano que influi nesta mesma sociedade. E isso é tão sério que muitos líderes ainda olham com desconfiança para aqueles que ingressam nas universidades, vão para o seminário teológico ou gostam de atividades mais voltadas às artes, como a poesia, a música, a dança, entre outras. Tais líderes parecem acreditar que quaisquer outras atividades que conduzam à reflexão, bem como, à admiração e enlevo pelas formas e pelo movimento, que não envolva diretamente a Bíblia ou os credos da Igreja, são “impuras”, para não dizer contaminadas pelas hostes infernais. Contudo, em sua tentativa de “lutar e manter a pureza espiritual da Igreja”, acatam que produções artísticas “gospel” tenham a “cara do mundo”, incluindo o caráter, a conduta e a vida de muitos de seus produtores e artistas.
Não podemos, ou melhor, não devemos nos isolar de tudo como se fôssemos “et’s”, ou passar a viver dentro de uma bolha, pois nossa missão é alcançar os que estão lá fora, aqueles que convivem conosco nos ambientes onde obrigatoriamente devemos ir. A necessidade real que se apresenta diante do contexto que temos apresentado neste artigo, reside na preparação dos crentes no conhecimento da Palavra, na santificação e na busca por discernimento, quando poderemos separar o que é bom, o que é saudável, daquilo que é indevido, que é insalubre espiritualmente. Podemos viver em santidade e servindo ao Senhor, sem que deixemos de ser “antenados” e sem que não possamos nos deleitar com elementos prazerosos que, enfim, foram deixados por Deus para nós, como a boa arte em geral.

Assim, a Igreja precisa sair do casulo da soberba, que fomenta a inflexibilidade e a intolerância, o que não implica em abrir mão dos princípios bíblicos e de suas crenças. Isto reflete em diálogo, em participação e em oportunidades.

Precisa estar conectada ao conhecimento, às inovações, às perspectivas sociais, econômicas, culturais e políticas futuras, acompanhando o ritmo das transformações no mundo, sem perder o lastro espiritual dos princípios eternos que lhe foram legados por Deus, através de sua Palavra.
Em terceiro lugar, implica em uma Igreja solidária, que atente desinteressadamente para as carências das pessoas, sejam de ordem espiritual, sejam de natureza material, abraçando o conceito de missão integral como forma de materializar as propostas do evangelho de Jesus Cristo.
A Igreja precisa manter viva a perspectiva do socorro ao necessitado, com amor e desprendimento. Um socorro que alcance os “domésticos da fé”, porém que ultrapasse os muros eclesiásticos, espraiando-se onde houver dor, lágrima, sofrimento (Gl 6.10).
Em quarto lugar, implica em uma Igreja que lute por aquilo que crê, através de uma fé sólida, através do conhecimento das Escrituras e sua contextualização, de argumentos adequadamente fundamentados e que desperte o interesse das demais pessoas.
A Igreja precisa aprofundar sua reflexão sobre as Escrituras, através de seu estudo sistemático, da revelação espiritual pelo quebrantamento, pela oração e pelo jejum, passando a exercitar seus princípios no cotidiano de suas atividades.
Finalmente, em quinto lugar, implica em uma Igreja que busque, preserve e considere a Unidade, acima de todas as diferenças humanas, doutrinárias e outras infrutíferas para a consolidação do Reino de Deus entre os homens.
A Igreja precisa viver a realidade da unicidade da Noiva do Cordeiro, independente do entendimento díspar que alguém possa ter. Precisamos ter em mente que existem doutrinas fundamentais à identidade da Igreja cristã evangélica, comuns a todas as comunidades que professam essa fé, e outras consideradas secundárias, que podem variar de denominação para denominação.
A unidade promove a força, pois, ao contrário “(...) todo o reino dividido contra si mesmo é devastado; e toda a cidade, ou casa, dividida contra si mesma não subsistirá.” (Mt 12.25).
A unidade atrai porque dá a entender que, apesar das possíveis diferenças existentes entre essa ou aquela comunidade, as portas da inclusão e da participação estão abertas. Todos e cada um têm seu espaço e voz. Há lugar para a harmonia, para o entendimento, para a paz e para o diálogo. Isso faz diferença em um mundo fragmentado, excludente e egoísta.
Essas implicações que decorrem da missão bíblica da Igreja, constituem traços elementares da identidade eclesiástica que não podem ser perdidas, pois a salvação constitui-se uma mudança de identidade, onde passamos a ser “novas criaturas” (2 Co 5.17) e somos restaurados em nossa imagem e semelhança com o Criador. Logo, nosso discurso, nossa cultura, nossa postura, nossas perspectivas, enfim, nossa cosmovisão, deve se manter firme sobre os princípios basilares da fé cristã, consignados na Bíblia Sagrada.
Finalmente, podemos entender que a identidade é algo transitório, onde somos submetidos a um processo contínuo de metamorfose, porquanto vai sendo construída ao longo do tempo, conforme somos edificados e amadurecemos por meio de nossas experiências e do conhecimento que adquirimos, como podemos inferir do que nos ensina o livro de Provérbios, quando registra que “a vereda dos justos é como a luz da aurora, que vai brilhando mais e mais até ser dia perfeito.” (Pv 4.18). Entretanto, existem princípios que são permanentes, têm caráter absoluto, os quais identificam o Corpo de Cristo, estabelecidos por Deus e confirmados no Evangelho de Jesus Cristo. São esses fundamentos que devem reger a vida e os propósitos da Igreja do Senhor e de todos aqueles que a integram.

ENFIM...

            Nomear pessoas de desigrejadas, como um adjetivo que as coloca em uma categoria inferior, sem que haja uma análise mais detida sobre os motivos que provocaram seu afastamento da igreja institucional, como afirmamos inicialmente, parece um tanto precipitado.
            Cremos que opinar sobre uma temática tão complexa requer uma reflexão sobre essa crise que alcança as pessoas de uma forma geral. Estamos sob pressão cotidianamente, em todas as áreas de nossa vida, cercados de conceitos que mudam, modelos que se transformam, inovações vocabulares, informacionais e científico-tecnológicas. Somos exigidos em ser como na música de Raul Seixas, uma “metamorfose ambulante”. Este é um mundo de incertezas, repleto de pessoas que buscam respostas e a segurança de uma certeza que seja. Como encontrar a certeza? E acreditamos que certeza, neste caso, pode ser lida como verdade. Então, como encontrar a verdade? Ou ainda, o que é a verdade?
Isso é o que conduz muita gente à Igreja (ou para longe dela), ou seja, a busca pela verdade.
Jesus afirmou (e nós cremos) que Ele é a verdade (Jo 14.6). Mas será que a Igreja contemporânea tem conseguido repassar essa mensagem de forma convincente? Será que temos apresentado essa verdade integralmente, cumprindo nossa missão, de maneira que as pessoas possam crer nisso e assim, alcançar respostas para suas inquietações?
Acreditamos que quando alguém se desigreja, desconsiderando os casos nos quais a pessoa está definitivamente convencida da não relevância de congregar-se, desacreditada de qualquer sistema eclesiástico por falta de conversão ou por um espírito de permanente rebeldia, houve uma falha na formação e/ou desenvolvimento do caráter cristão do desigrejado, e isto é uma questão de discipulado, cuja responsabilidade é não só da liderança eclesiástica: inclui todo o Corpo.
Contudo, esse não é um defeito isolado de outros fatores, pois o discipulado é parte fundamental da missão da Igreja e do seu exercício cotidiano. Nossa visão é que a não observância de uma renovação permanente, de uma busca constante por aprimorar a identidade da Igreja como agência do Reino de Deus na terra tem produzido esse exército de soldados, feridos em nome de Deus.
    Queremos fechar essa reflexão com a ideia de que não somos cristãos porque pertencemos a uma igreja: pertencemos à Igreja porque somos cristãos! Entretanto, para que sejamos cristãos verdadeiros e exercitemos essa condição, precisamos estar no contexto da Igreja, pois como afirmou o Pr. Renato Vargens, “a Igreja é uma instituição de origem divina, e é bom que aqueles que pensam ser possível desenvolver uma fé longe dela lembrem-se de que foi criada por Deus e para a glória do seu nome” (VARGENS, 2013, p. 32).
 
 

REFERÊNCIAS


BAUMAN, Zygmunt. Identidade: entrevista a Benedetto Vecchi. Tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005.

BÍBLIA. Português. Bíblia de Estudo Palavras-Chave Hebraico e Grego. 3. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2012. Texto Bíblico: Almeida Revista e Corrigida, 4. ed., 2009. Sociedade Bíblica Brasileira.

DUBAR, Claude. A socialização: construção das identidades sociais e profissionais. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

FARIA, Ederson de; SOUZA, Vera Lúcia Trevisan de. Sobre o conceito de identidade: apropriações em estudos sobre formação de professores. Psicol. Esc. Educ. (Impr.), Maringá,  v. 15, n. 1, jun.  2011 . Disponível em . Acesso em  23  dez.  2013.

VARGENS, Renato. A noiva de Cristo está falida? Cristianismo Hoje. Niterói, ano 7, ed. 37, p. 31-32, out/nov, 2013.  
   

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